Até pouco
tempo atrás, pessoas com alergia a algum alimento tinham de eliminá-lo de sua
dieta. Mas pesquisas recentes têm demonstrado a eficácia de uma nova
alternativa: a imunoterapia por dessensibilização, que consiste em expor o
paciente a quantidades pequenas e crescentes do alimento que provoca a reação
alérgica.
Caso a
resposta do paciente seja positiva, ele não precisa mais se privar do
ingrediente e, além disso, livra-se do risco de consumi-lo sem saber, no meio
de alimentos industrializados. ?Essa é uma mudança recente que tem ocorrido no
tratamento de alergias a alimentos mais comuns, como leite, ovo e trigo?,
afirma a médica Ariana Campos Yang, da Associação Brasileira de Alergia e
Imunopatologia.
Um dos
estudos que comprovou o sucesso da estratégia foi publicado neste ano pela
revista New England Journal of Medicine. Pesquisadores da Universidade da
Carolina do Norte submeteram 40 crianças de 5 a 11 anos alérgicas a ovo ao
consumo diário de um pó à base de ovo.
A quantidade
do produto, no início muito pequena, foi aumentando progressivamente. Depois de
22 meses, as crianças passaram por um teste no qual ingeriram 10 gramas do alimento,
o que equivale a dois ovos inteiros. O resultado foi que 75% dos participantes
conseguiram passar no teste e começaram a tolerar o consumo de ovo.
Outra
pesquisa, divulgada pela Universidade de Cambridge em março, testou a técnica
para tratar alergias a amendoim. Crianças com alergia severa receberam
quantidades crescentes de farinha de amendoim, o que fez com que se tornassem
tolerantes ao alimento.
A alergia
ocorre quando há um erro no sistema imunológico. Com a função de nos defender,
o sistema pode errar nessa tarefa e provocar uma reação forte contra um
alimento que, para outras pessoas, é inofensivo. ?Quando começamos com uma dose
menor e aumentamos de forma contínua, conseguimos induzir as células
regulatórias, que consertam o que está errado no sistema, deixando assim de ter
aquela reação contra o alimento?, diz Ariana, que aplica o tratamento no
Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP).
?No início,
o alimento é ingerido em concentrações muito diluídas. Começamos com doses bem
pequenas por via oral até chegar ao alimento puro. Cerca de 90% dos pacientes
têm boa resposta?, observa Ariana.
Reação
imediata. No HC, essa estratégia já vem sendo adotada há cerca de dez anos. Nem
todo alérgico é candidato ao tratamento, mas podem se beneficiar aqueles que
têm a alergia conhecida como IgE mediada, na qual a reação ao alimento é
imediata.
?O fato de a
reação ser rápida facilita a dessensibilização, pois já se sabe na hora se o
paciente teve ou não reação. Nas alergias tardias, em que os sintomas começam
horas ou dias depois, não se sabe qual dose o paciente está tolerando?, explica
Ariana. Existe também uma idade mínima para o início do tratamento, de 5 anos,
pois antes disso a alergia pode desaparecer sozinha.
Especialistas
lembram que esse tipo de tratamento jamais deve ser feito sem acompanhamento
médico. ?O tratamento deve ser feito em uma instituição segura. Existe um risco
de o paciente ter um choque anafilático, por isso é preciso ter recursos de
tratamento e profissionais habilitados para lidar com uma reação?, diz a
alergologista Yara Arruda Mello, do Hospital São Luiz.
Segundo
Yara, a alergia alimentar pode ter manifestações na pele, com urticárias, no
trato digestivo, com diarreia e vômito, ou no sistema respiratório.
Para o
médico gastroenterologista Aytan Miranda Sipahi, do Hospital Sírio-Libanês, os
casos de alergia têm aumentado. ?Discute-se se o aumento veio com a maior
capacidade de diagnosticar ou se houve um aumento de verdade?, afirma. Ele
observa que fatores ambientais como o aumento da poluição e dos aditivos
agrícolas usados na alimentação poderiam ser responsáveis por este aumento.
Fonte: Estadão